Acho que a invenção de uma máquina do tempo talvez seja a coisa mais urgente dentre tantas tecnologias que ainda precisam ser inventadas.
Poder voltar para rever com mais calma e a dose necessária de atenção aquele momento em que tudo na sua vida mudou e, na época vivida, você não percebeu que aquele conjunto de segundos seria tão decisivo para o seu destino.
Conseguir olhar de novo e demorar mais nessa nova chance para captar com perfeição o primeiro olhar que você trocou com o seu bebê recém parido, sentir novamente a textura úmida e macia da pele daquela nova vida, as mãos ainda tão pequenas e já cheias de força para esticar os dedos em um choro de tomada de fôlego.
Poder se demorar um pouco mais naquela troca de olhares antes da primeira faísca do que viria a ser o grande amor da sua vida.
Abraçar mais apertado naquela que seria a despedida ainda não sabida.
Naquele dia que você não foi para a escola, justo naquele dia aquele momento memorável aconteceu e você ficou de fora das piadinhas e conversas pelo resto da semana, tudo porque escolheu não levantar cedo. Poder voltar e finalmente entender o quão grande era o tal gambazinho que invadiu a escola.
Aproveitar que não perdeu outra vez aquele dia de aula e, só dessa vez, prestar atenção naquela explicação sobre qualquer coisa que o professor tentava ensinar para 2 ou 3 interessados. Agora você sabe que essa atenção negada ao professor - talvez porque entender as piadas sobre o gambazinho pareciam mais importantes - te fazem falta até hoje na hora de um vestibular ou um concurso público.
Não adiar a visita ao avô no hospital, porque embora você tenha ficado com medo de vê-lo ali, frágil, machucado e imóvel na cama; seria aquela a sua chance derradeira de dizer o quanto o amava e respeitava sua história.
Até nas pequenas coisas, como uma nova chance de ficar em casa lendo um pouco mais ao invés de ir para a rua com tanta frequência. Ou ir para a rua com mais frequência ao invés de ficar trancada em casa pensando besteiras.
Aprender a se amar mais cedo, valorizar o corpo que sempre foi bonito e você demorou anos para rever fotos e se admirar com carinho.
As pequenas coisas que definiram toda a sua vida e você não escolheu conscientemente seguir por esse rumo. Escolheu sempre no automático. Decidiu sempre pelo mais fácil ou pelo caminho já conhecido. Poder voltar atrás e pensar com calma, escolher diferente já sabendo que naquela porta não tinha o prêmio, tinha o gorilão correndo atrás de você, como naquele programa da infância. Gritar "SIIIIM" agora sabendo que trocar a bicicleta pela caixa de fósforos seria mais útil, já você nunca andou de bicicleta e, por muitas vezes, quando esteve no escuro, um único palito de fósforo teria sido a sua salvação.
Poder voltar no tempo e refazer exatamente as mesmas escolhas do passado, porque elas te trouxeram ao ponto que você sempre sonhou. Mas, dessa vez, aproveitar melhor a viagem com a certeza de que, no final, o descanso seria na sua casa já conhecida e confortável.
***
Sabe quando a gente começa fazendo um suco de laranja e acaba com uma jarra de suco de limão? Acabou de acontecer.
Trilha Sonora: Gilberto Gil - Super-Homem, a Canção na rádio
Nenhum comentário:
Postar um comentário