segunda-feira, 14 de abril de 2008

Cartas para não enviar (2)

Mãe Velha;
Já faz tanto tempo desde a última vez que nos vimos...
Tanto tempo que não me lembro como foi.
Minha memória fraca não me permite lembrar do nosso último abraço mas, ainda bem!, não apagou as recordações mais importantes.
O som da sua voz, o cheiro do seu cabelo, a sensação engraçada de tocar sua pele "muchinha de quem vai morrer", a graça das suas risadas (gargalhadas), suas frases e sábias expressões populares...
Tudo isso é parte de mim e nada me tira o orgulho de ser neta de quem eu sou.
Foi nas tuas mãos que vi morangos pela primeira vez.
"Experimenta, minha filha. É gostoso."
"Ai, credo! Não quero, não, mãe velha! É azedo!"
Minha frescura infantil não sabia, mas aquele momento jamais sairia da minha memória: a primeira vez que comi um morango. E não gostei, mas você já sabia que era bom e, hoje é a minha fruta preferida.
O seu desejo de me ver 'estudada, com um diploma'. Estou realizando! Quase lá, aos trancos e barrancos, mas estou realizando.
E queria que você pudesse ver a mulher que me tornei. A 'gordinha da mãe velha' não cresceu muito, porque a altura não era mesmo o gene forte da nossa família, mas muita gente diz que eu sou uma grande mulher, uma grande amiga e, então, vai ver eu sou mesmo.
E poucas coisas me dão mais orgulho do que ser comparada a você.
Quando dizem que 'a filha da Rute é a cara da Antônia', eu apenas sorrio e penso que não poderia ser melhor. Ser comparada à mulher mais forte que eu já conheci é o maior estímulo para que eu me torne, pelo menos, metade do que você foi.
E eu sigo tentando.
Nas horas complicadas, quando não sei para onde correr, eu imagino o seu abraço me protegendo e me sinto bem, pronta para ir em frente.
Não é fácil... Mais de 10 anos e eu ainda não sei conviver com a sua ausência.
Imagino tudo o que não aconteceu porque você teve que ir embora, e me dói. Lembro de tudo o que vivemos e me ilumino por dentro.
Mesmo com toda a confusão espiritual que eu faço, as minhas incertezas divinas e todo o resto; eu acredito que, de algum lugar, você olhava por mim.
Agora, ainda não sei muito bem como, mas eu gostaria de poder olhar por você.
Saudades (no plural, porque é saudade demais)

***
Trilha Sonora: Educação Sentimental - Penélope e Biquíni Cavadão. "É tanto medo e sofrimento Que eu sofro só de pensar". A melhor versão!

4 comentários:

Mike disse...

Belo texto, querida Mila
Saudades de quem já foi (e tb de alguns que permanecem por aqui).
Bj

Dread disse...

Sim, você é uma grande mulher, uma grande amiga :D.
e olha que faz pouco tempo que nos conhecemos.
Enquanto sentimos saudades, é que ainda pensamos com ternura e carinho em quem se foi.

beijos morena linda :D

Tay F. disse...

Lindo texto, Ca!

Dread disse...

E não sei por que, eu ainda me emociono quando leio esse texto.

Sempre que chego na parte em que você cita mas muita gente diz que eu sou uma grande mulher, uma grande amiga e, então, vai ver eu sou mesmo. eu tenho certeza de que você é tudo isso e muito mais.

Acho que essa saudade é aquela que sempre teremos, pois é uma saudade bela.

te amo.