quarta-feira, 6 de março de 2013

Do Que São Feitas as Memórias

Acordei hoje com a noticia da morte do Chorão. Dei um pulo na cama e vim para a sala ver se era mesmo o que eu tinha entendido. Meu irmão confirmou e então um filminho com lembranças de 15 anos atrás começou a passar na minha cabeça.
Eu gostava da banda, mas não era a maior fã dele, como uma amiga minha é, e ela foi a primeira pessoa que me veio na cabeça, ainda nos créditos desse filminho.
Passou um tempo, fiz outras coisas, cuidei da minha filha e agora há pouco, no banho, é que fui fazer a edição mental do tal filminho.
Começa em 1998, quando meu pai apareceu em casa com uma edição da Revista Jovem Pan. Era uma revista enooooorme, do tamanho de um jornal e trazia junto um CD com as mais tocadas da Pan. Entre a seleção de umas 10...15 músicas, tinha O Coro Vai Comê na faixa 2, de uma até então desconhecida banda chamada Charlie Brown Jr.
Esse CD rodou a mão de algumas amigas minhas, não por causa da tal faixa 2, mas de algumas outras músicas que agora não lembro mais, mas eram sucesso na época.
Passou mais um tempo e ouvimos mais da banda e viramos fãs porque, daquele jeito maloqueiro-skatista-calça-mostrando-a-bunda, as músicas eram divertidas e algumas até falavam de amor.
Acho que a identificação aconteceu justamente porque era esse o nosso perfil e, principalmente, era o perfil dos namorados e candidatos a namorados das minhas amigas e meus. Nunca subi em cima de um skate mas, por alguns anos, era um pré-requisito para um cara ser interessante: andar de skate. Namorei um. Minhas amigas namoraram outros. Cada uma de nós tem pelo menos uma história pra contar com esse tipo tão atemporal de homem.
Mas era do filminho que eu falava.
Fiquei pensando, o que faz de um momento banal, um momento digno de filminho?

Lembro perfeitamente, como se tivesse sido há poucos dias, de uma amiga minha descendo a rua da minha casa para ficar com um primo (skatista) de um namorado meu (skatista) e minhas outras amigas e eu ficando no portão de casa, olhando os dois se afastando enquanto vinha de dentro de casa o som alto, muito alto, de Proibida Pra Mim.

Não me esqueço também de um dia em que sem motivo nenhum, como ele sempre fazia, esse namorado da época me deu uma folha de sulfite com alguns desenhos aleatórios e uns versos de músicas que gostávamos. A cena é toda muito nítida pra mim: estávamos na calçada da minha casa, chegando da escola e, conforme um tipo de tradição que ele seguia, esperava até a despedida pra me dar os presentinhos quase diários. Combinamos de ficar à toa na rua mais tarde e, antes de dizer tchau, ele me deu a tal folha com os desenhos e os versos "Se não eu, quem vai fazer você feliz?" e um trecho de Presente de Um Beija-Flor que já não me lembro mais qual era.

Depois vem a cena daquela minha amiga apaixonada pela banda e, principalmente, pelo Chorão, me chamando para acompanhá-la numa aventura: teríamos que ir de Osasco até a Avenida Paulista de ônibus, numa época em que mal saíamos sozinhas, para vermos a banda em uma tarde de autógrafos que aconteceu na Rádio Mix, no famoso prédio de n° 900, o prédio da Gazeta. Ela se informou antes e acertamos o caminho, linhas de ônibus, pontos a descer e fomos. Deu tudo certo e, nesse "tudo certo" inclua uma fila de mais de 3 horas, rodando um quarteirão para conseguirmos entrar, trocar duas palavras com eles conseguir autógrafos enquanto eu ficava encarregada de tirar tantas fotos quantas fossem possíveis em coisa de 2 minutos. Voltamos pra casa com autógrafos, fotos, histórias pra contar e um sorriso de cansaço e satisfação no rosto.

No filminho entra também a cena da minha irmã e eu lendo o encarte do CD do Charlie Brown que meu pai deu de presente a ela, na sala da nossa casa, cantando as músicas e ouvindo no modo Repeat dezenas de vezes a música Te Levar. Sempre preferi as românticas.

E de tantas tardes vendo Malhação, uma em especial me marcou. Não me lembro o motivo, mas nos juntamos para ver um capítulo qualquer na minha casa: minha irmã, meu namorado, uma amiga nossa, minha mãe, o tio da nossa amiga e eu. A música de abertura era Te Levar e, como era sucesso na época, todos cantaram um pedacinho, bateram o pé ou batucaram ao som da abertura.

Tive muito mais momentos ao som de alguma música deles, mas esses, exatamente como descrevi, resolveram que ficariam eternos pra mim e eu sei que as outras pessoas envolvidas talvez nem se lembrem mais de nada disso. Mas eu me lembro e hoje, especificamente por causa da morte do Chorão, tudo isso  voltou e eu me pergunto, o que faz um momento ser eterno? O que facilita a memorização de uma coisa e de outra não, sendo tudo igualmente corriqueiro? Não falo de momentos "obrigatoriamente" importantes, como o primeiro beijo, nascimento do seu filho, morte de alguém querido, primeiro dia de aula... Falo dessas coisas bobas, facilmente esquecidas em alguns meses, mas que de vez em quando teimam em ficar gravadas sem motivo aparente.
No fim das contas, acho que a vida é feita disso apenas. Lembranças.
Como saber que este exato instante em que termino de escrever esse post ou você termina de ler, não ficarão eternizados naquele departamento de memórias que só interessam a nós mesmos? A diferença é o que significa para cada pessoa envolvida.

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Sem links porque estou com preguiça de procurar. Depois eu volto e incluo tudo direito. Ou não.

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Trilha Sonora: Meu irmão, enlutado, ouvindo Charlie Brown Jr. que surgiu na minha vida 1 anos antes do nascimento dele.

2 comentários:

Gabi Romeiro disse...

texto lindo, como sempre...
<3
acho que a nossa alma organiza as lembranças em hashtags, e o chorão tá em muitas minhas também.
que vá em paz :)

@JulioCesardiz disse...

Putz, meus olhos marejaram só de ler.
Eu sou muito fã do cara, e já comecei a escrever sobre o meu filminho também... o que está atrasando é a falta de tempo, e o olho marejado sempre que começo a contar a história desse filme. Ótimo post, gostei!