domingo, 10 de março de 2013

Sobre o Medo da Morte

Eu nunca tive medo de morrer. Nunca mesmo.
Atravessava a rua na frente dos carros, obrigando-os a parar porque, conforme eu costumava argumentar quando minha mãe me chamava a atenção por isso "nenhum deles quer realmente me atropelar, então eles que parem o carro se não quiserem ir presos". Minha mãe ficava louca, dizia que um dia eu podia encontrar um que não ia conseguir parar. E eu seguia atravessando a rua sem olhar e sem esperar muito pelo sinal fechado.
Nunca gostei de médicos e hospitais, porque eu sempre fui da opinião que quem procura, acha. Então se eu não estou sentindo nada de estranho e nem estou com um pedaço do corpo pendurado, quase caindo, não há motivo para pânico e muito menos para marcar uma consulta médica e ouvir um estranho me dizer que estou me alimentando mal, que estou acima do peso e deveria me exercitar mais.
Remédios? Só em casos extremos, como a época em que eu tinha uma crise de gastrite por noite e só conseguia dormir sob efeito de diclofenaco (depois de vomitar com uma cápsula de omeprazol, tomar duas xícaras de chá de camomila e andar em círculos pelo quarto até me concentrar no cansaço das pernas e esquecer a dor no estômago).
Pensava em pular de pára-quedas um dia, andar balão e sair pelo mundo fazendo mochilão "clássico" (com carona e sem lugar certo pra dormir).
Não tinha medo de ficar doente, não tinha medo de assalto, não tinha medo de acidente, não tinha medo de nada.
Até que eu me tornei mãe. O medo da morte passou a ser uma coisa tão apavorante que agora eu não perco uma consulta médica, sigo ordens em benefício da minha saúde, como coisas que não gosto (mamão, eca!) para que meu corpo funcione melhor, olho para os dois lados antes de atravessar a rua e espero o sinal fechar e todos os carros estarem parados. Uso até faixa de pedestres agora, vejam que exemplo lindo!
O que acontece é que continuo não sentindo medo do que haverá do outro lado e se haverá um outro lado. Li uma vez que preocupar-se com a morte é inútil, porque se tiver algo para ver do outro lado, um dia veremos e se não tiver nada, nunca saberemos. Não me lembro quem disse isso, mas tomei como verdade e desde então eu não me importava com essas coisas.
Só que agora, saber que uma vida depende de mim, dos meus cuidados e do meu amor; que tenho uma criança que espero ver crescer e aprender o que é o mundo, que quero ensinar coisas a ela, que quero estar perto dela para sempre... Tudo isso mudou a forma como vejo a minha vida, mudou os meus medos, meus planos, meus desejos. O que houver do outro lado, haverá ou não. O que me preocupa mesmo é poder adiar essa descoberta o máximo que eu puder, ficar por aqui enquanto houver necessidade de uma mãe cuidando de uma filha, porque eu devo ser essa mãe. Não quero que essa responsabilidade seja passada a mais ninguém.
Se me perguntarem hoje se eu tenho medo da morte, vou responder o mesmo que respondi ao meu irmão ontem, quando ele me viu esperar a hora mais segura para atravessar a rua: depois que você tem um filho, você passa a cuidar melhor da sua vida.

***
Trilha Sonora: Uma música na minha cabeça, mas não sei o nome dela e muito menos sei quem canta. Se eu descobrir, eu conto.

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