sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Porque Drummond é sempre Drummond

Os Ombros Suportam o Mundo

Chega um tempo em que não se diz mais: meu
Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos
edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

(Carlos Drummond de Andrade)

***
Trilha sonora: I Want You - Bob Dylan. E antes várias outras dele (no Greatest Hits).
Momento "Você Sabia?": essa música, I want you, é a original daquela do Skank, Tanto ("É tanto É tanto Se ao menos você soubesse")

5 comentários:

Mike disse...

Eu conhecia apenas parte deste poema do Drummond. De uma narração feita pelo Enrique Diaz (um grande ator e um dos mais experimentais diretores de teatro)para o show da Marina chamado "Sissi na Sua", de 2000. Não fui ao show, mas tenho o cd e sempre ouço a narração de parte deste poema. Acho muito bom!!!

Quel disse...

Você me disse que ainda não estava acostumada com o adjetivo "escritora".
O Drummond explica isso: "Escritor: não somente uma certa maneira especial de ver as coisas, senão também uma impossibilidade de as ver de qualquer outra maneira."
Se indentificou, então é o que você é!
Gosto bastante de Drummond...até porque Drummond é Drummond né!

Também gosto do Fernando Pessoa, daquele verso, do Livro do Desassosego: "- Encontro às vezes, na confusão vulgar das minhas gavetas literárias, papéis escritos por mim há dez anos, há quinze anos, há mais anos talvez. E muitos deles me parecem de um estranho; desconheço-me deles. Houve quem os escrevesse, e fui eu. Senti-os eu, mas foi como em outra vida, de que houvesse agora despertado como de um sono alheio." - Vai saber, o que vamos pensar daqui ha 15 anos do que escrevemos hoje...enfim "Tudo se me Evapora..."

E quanto a trilha amo as duas musicas!!!

*Escrevi muito né, viajei um pouco..rsrs
CHEGA!

disse...

Eu só queria ter dividido uma mesa de bar uma noite da minha vida com o Drummond, mas o papai noel só atende a pedidos fáceis. :(

Zaira Brilhante disse...

Putz to com a Jo...
Esse poema me balancou agora... uma pontinha de depressao quis me morder, mas passou... eh drummond, nao da pra ler e ser a mesma pessoa depois!!! definetely!! =)

Zaira Brilhante disse...

Vixiiii nao consigo escolher cinco... e nao conhecia os tres ultimos!! fiquei curiosa pra assistir Oblongs... que surreal!!! bjsss